Um dos livros mais lidos do mundo chama-se “A Arte da Guerra”, um tratado militar escrito durante o século IV a.C., pelo estrategista conhecido como Sun Tzu. Um ótimo início para quem quer entender das estratégias sócio-políticas que o ser humano é capaz de fazer.

Hoje, vivemos um período deste tipo de aplicação entre Rússia e Ucrânia. Mas estas estratégias vão muito além de questões de domínio de territórios. A seguir, uma bela interpretação destes motivos:

Considerações cronológicas sobre a guerra na Ucrânia:

1. O CABO DE GUERRA

Durante anos, a Ucrânia esteve no centro de um violento impasse entre os EUA e a Rússia. No meio disso, um povo ucraniano bastante dividido sobre o assunto, com um ocidente pró-ocidental, e um Oriente pró-Russo.

Por um lado, uma Rússia que quer restabelecer, com Putin, sua influência sobre os países da antiga União Soviética. Por outro lado, os Estados Unidos, via OTAN, que continua a aplicar a estratégia de “contenção”, visando reduzir a influência da Rússia, desde 1947.

O fato de os russos não serem mais comunistas não muda quase nada dessa vontade da OTAN; ideologias são secundárias em alianças. Esta é uma questão clássica e antiga no mundo da grande rivalidade de poder.

Antes de 1991: A Ucrânia só existiu como um Estado independente entre 1917 e 1922. Então, é claro, experimentou o período soviético, notavelmente marcado pela fome causada por Stalin, causando milhões de mortes (1931-1933).

Depois de 1991: Em 1991, sob o impulso do Movimento da Independência Roukh (“movimento”), renasceu de suas breves cinzas, durante a queda da URSS.

1994: Proteção ocidental pelo Memorando de Budapeste. Os ucranianos obtiveram, através deste memorando, a garantia de respeito por sua integridade territorial dos americanos, britânicos e russos, em troca do abandono de seu arsenal nuclear.

2. 2004, A REVOLUÇÃO LARANJA PRÓ-OESTE

Naquele ano, dois candidatos concorreram à eleição presidencial: um pró-Ocidente (UE, OTAN, Estados Unidos…), Viktor Yushchenko (apoiado pela altamente divulgada, na Europa, Yulia Tymoshenko, foto), e um pró-russo, Viktor Yanukovych.

Naturalmente, o primeiro é apoiado pelos EUA, especialmente por meio de fundações e organizações como a Fundação Soros ou a Freedom House (além da Fundação Clinton); o outro é apoiado por Putin. Ambos também têm generosos fãs bilionários.

O pró-russo Yanukovych é eleito (foto abaixo). Portanto, seu oponente Yushchenko contesta este resultado, considerando a eleição fraudada. Grandes municípios recusam o resultado, como Kiev.

Grandes manifestações são organizadas (com apoio externo), principalmente em Kiev, por 2 semanas, com o lenço laranja (lenços, faixas, etc.) como sinal de protesto.

A eleição foi anulada pela Suprema Corte ucraniana, e uma nova eleição foi realizada no final de dezembro. E adivinha? O pró-Ocidental Yushchenko é eleito; depois de uma campanha marcada por seu envenenamento, tendo que se submeter a um transplante de pele no rosto, no meio da campanha.

Este, sem surpresa, se aproximou da Europa. Mas a crise econômica de 2008 chegou, e ninguém, nem mesmo a Ucrânia ocidental, estava satisfeito com a política de Yushchenko. Ele se chafurdou nas eleições presidenciais de 2010 (5,5%).

3. VINGANÇA DOS PRÓ-RUSSOS

Na verdade, seu companheiro Tymoshenko tornou-se a nova figura do lado ocidental da Ucrânia, mas perdeu para Yanukovych, o oficial eleito pró-russo que havia sido deposto pela Revolução Laranja.

Em 2011, Tymoshenko foi preso (acusado de abuso de poder em uma história de contratos de gás). Tudo parecia estar sob controle para Yanukovych; além disso, os russos aparentemente teriam vantagem sobre os americanos.

Em 2013, Yanukovych fez um acordo de livre comércio com a UE, mas as relações estavam frias: a UE há muito o pressionava acusando-o de autoritarismo. O presidente então enterrou o acordo, e se voltou para Moscou.

4. NOVA REVOLUÇÃO PRÓ-OCIDENTAL

No final de 2013, surpresa (ou não): a história se repete. Pouco depois dessa perda infligida à UE, um novo movimento de protesto, o Euromaidan, organizou novas manifestações na Praça da Independência, em Kiev (daí seu nome).

Este se transforma em motins (com dezenas de mortes), e força Yanukovych a ir para o exílio na Rússia em fevereiro de 2014. Uma nova eleição é realizada, e coloca à frente do país um presidente pró-ocidental, o empresário Petro Poroshenko.

5. SEPARATISMO PRÓ-RUSSO

Problema: a parte pró-russa da Ucrânia (Leste) não aceita esta nova derrubada. Em Donbas, ou na região de Luhansk, o movimento Maidan é rejeitado. Idem na Crimeia.

Em março, a Crimeia proclamou sua independência, depois juntou-se à Rússia após um referendo. No leste, separatistas pró-russos proclamaram a República Popular de Donetsk e a República Popular de Luhansk.

2014: A Guerra de Donbas começa entre as forças armadas ucranianas, que querem recuperar esses territórios, e os separatistas. Isso causou cerca de 10.000 mortes. Dois milhões de pessoas fugiram da região, incluindo 250.000 para a UE, e 350.000 para a Rússia. A UE obteve seu acordo de livre comércio com o novo presidente.

Como de costume, os Estados Unidos e a Rússia deram uma mãozinha aos dois campos antagônicos: CIA, por um lado, empresa mercenária privada, por outro, e já se suspeitava disso na época:

2015: Acordos de Minsk II Os chefes de Estado da Bielorrússia, Alemanha, França, Rússia e, claro, Ucrânia se reúnem e decidem sobre um cessar-fogo, que reduz a intensidade do conflito… que se arrasta de qualquer forma.

Os separatistas continuam a se considerar independentes, e de fato, os Estados são formados, produzindo seus próprios passaportes, administrando uma pequena parte do território reivindicado (reivindicações gigantescas, ver mapa), com seu próprio governo, bandeira, etc.

2018: Alexander Zakharchenko, oficial e especialmente presidente do Representante Donbas popular, é assassinado em um ataque a bomba em Donetsk.

6. UCRÂNIA AO OCIDENTE 2019:

Petro Poroshenko, o presidente pró-ocidente desde 2014, teve problemas para se manter e fez o que pode nas eleições presidenciais, enfrentando a surpreendente Volodymyr Zelensky, atual presidente.

Presidente Zelensky: cidadão comum, ator de séries de TV que tinha acabado de interpretar o papel de um cara comum que tornou-se presidente da Ucrânia (um pouco por acaso).

Ele de forma premonitória interpretou a própria história e comemorou com uma festa com o nome da série!

Este último foi eleito em um discurso que alguns descreveriam como “populista”, contrário à corrupção de políticos, democracia direta, etc. Seu partido é, portanto, chamado como a série: “Servo do Povo”.

Sua imagem é rapidamente danificada, ele é acusado de ser manipulado por todos; ele nomeia pró-russos para certas posições-chave, e é acusado nos Papéis Pandora de ter mantido e criado empresas de fachada usadas para misteriosas transferências de dinheiro.

Mas, ao contrário do que se pode pensar, Zelensky não segue uma linha pró-Russa, e quer uma aproximação muito clara com a UE e a OTAN.

Por que agir assim? Porque Zelensky sabe que a Rússia em breve poderá vagar pelo leste da Ucrânia. Ao ameaçar se juntar à OTAN, está tentando tirar as ambições russas de seu território, ou pelo menos ganhar apoio americano e europeu.

7. A CHAVE : NORD STREAM 2

2018-2021

Por sua vez, a Rússia está completando seu gasoduto Nord Stream 2, de sua empresa Gazprom, conectando-o à Alemanha por via marítima, dobrando sua capacidade de trânsito de gás natural para a Europa por esta estrada.

O que isso tem a ver com a Ucrânia, você pode perguntar? É muito simples: o Nord Stream 2 deve permitir que a Rússia não dependa mais do gasoduto convencional que leva seu gás para a Europa, via Ucrânia.

Qual interesse? Vários: uma economia de 2 bilhões de euros anualmente, 3 bilhões de euros de déficit para uma Ucrânia pró-Ocidente e, acima de tudo: uma liberdade estratégica recuperada.

De fato, a venda de gás russo para a Europa é vital para Moscou. Além de ser um desastre financeiro, é, acima de tudo, uma grande alavanca do conflito, uma vez que torna a Rússia indispensável para a Europa.

Problema: a Ucrânia, no caminho do gasoduto “clássico”, pode desligar a torneira se quiser… De qualquer forma, os riscos de danos colaterais ao oleoduto – durante uma intervenção russa no leste da Ucrânia – poderiam vacilar a economia russa

A Ucrânia tinha, portanto, um meio de pressão tornando impossível fornecer apoio direto russo aos separatistas, tendo a possibilidade de fechar as comportas em caso de agressão; capaz de sufocar as vendas russas de gás no exterior, e, portanto, as finanças russas, ao mesmo tempo.

A Ucrânia está, portanto, diretamente ameaçada pela Rússia com este novo gasoduto Nord Stream 2, e o impasse em curso, desde 1991, provavelmente seria retomado violentamente entre americanos e russos.

2019: Entendendo o perigo, Donald Trump impõe sanções a todas as empresas participantes do projeto do gasoduto, e até ameaça a ruína financeira sobre os prefeitos das cidades (alemãs!) pelas quais passa (através de seus senadores).

Julho de 2021: O governo Biden finalmente cede, diante de uma Alemanha que está se mantendo firme, e uma Rússia determinada a terminar seu gasoduto, com as promessas econômicas americanas para a Ucrânia, muito fracas diante da ameaça que agora pesa sobre ela.

Logo depois, o Nord Stream 2 entrou em serviço completo, longe dos ucranianos. O gás russo agora está seguro, então nada impede Putin de ir diretamente para apoiar as repúblicas separatistas.

EPÍLOGO: Joe Biden ameaçou recentemente a Rússia de obstruir a rota Nord Stream 2 no caso de uma invasão do leste da Ucrânia. É difícil saber o que os americanos realmente podem fazer, especialmente porque a Alemanha está interessada nisso, neste gasoduto.

A Alemanha, como se sabe, depende muito do gás russo, e tem um exército extremamente pequeno. A França, por sua vez, não tem meios para se envolver em um conflito de alta intensidade, porque não tem tudo, do ponto de vista quantitativo.

A Inglaterra está na mesma situação. Finalmente, os Estados Unidos, o único poder capaz de parar a Rússia, provavelmente preferem evitar uma terceira guerra mundial apenas para salvar um pedaço da Ucrânia.

Então, tudo isso está caminhando para uma vitória russa, no impasse com os americanos sobre a Ucrânia, mas a que custo?

A Rússia está diversificando sua economia tanto quanto pode, a fim de não depender mais de suas exportações de gás e petróleo, e resistir às sanções externas. A custo da rendição da parte ucraniana pró-ocidente.

THE END

Ilustração e parte das informações: by Phil McNaughton.

Em outro momento, falarei sobre os laboratórios de armas biológicas da OTAN existentes na Ucrânia; outra possível causa do conflito.

Fonte: Twitter | (Cláudia) @LeichsenringC


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